Regulamentação dos aplicativos de transporte em Niterói segue sem definição
- Jornalismo UERJ
- 6 de mai. de 2019
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A fiscalização está suspensa mas decreto continua em vigor

Por Ana Paula Santelli
A Prefeitura de Niterói ainda não se pronunciou sobre as demandas discutidas na audiência pública, realizada no dia 15 de abril, com motoristas de aplicativos de transporte e usuários do serviço. Na audiência, presidida pelo vereador Bruno Lessa (PSDB), foi cobrado um cronograma para que o Poder Executivo resolva a regulamentação do serviço. O psdbista propôs a suspensão provisória do decreto 12.977/18.
Em junho de 2018, o prefeito de Niterói, Rodrigo Neves, publicou um decreto regulamentando o transporte remunerado de passageiros via aplicativo. De acordo com essas normas, veículos com mais de 5 anos de fabricação ou com placas de outras cidades não podem mais embarcar passageiros em Niterói. Para a Uber, maior empresa do setor, a implantação dessas medidas diminuirá o número de motoristas atuantes no município, gerando maior espera e até ausência de carros em certos horários.
Insatisfeitos com as novas regras, um grupo de motoristas da Uber, 99 e Cabify, chamados de Família Ponta a Ponta, organizou uma manifestação em frente a Prefeitura em prol da flexibilização do decreto, no dia 03 de abril, que conseguiu a suspensão da fiscalização. Segundo Leandro Xavier, presidente do grupo, o Executivo do município está analisando o documento, entregue por eles, com medidas que beneficiam ambos os lados, mas ainda não deu uma resposta.
- A Prefeitura cedeu, para grupos de empresários, vagas fixas, que limitam o espaço das ruas. Fiz um mapeamento onde notei que as vias que servem de escoamento para o tráfego de ônibus e carros estão praticamente interditadas. Pois os carros estacionados nelas fazem com que os ônibus parem no meio da rua para o embarque e desembarque de passageiros – afirma Leandro, rebatendo o argumento da Prefeitura de que os carros de aplicativo de outras cidades estariam congestionando o trânsito de Niterói. O líder do grupo também declarou que estará entrando em contato nessa semana com o secretário do executivo, Paulo Bagueira (SDD), para solicitar um prazo de resolução do regulamento.
Além da retirada da medida que proíbe o embarque de passageiros por veículos de outras cidades, o movimento também requisita o aumento da vida útil do carro de 5 anos para 10, visto que a média de idade da frota brasileira é de 9 anos e 7 meses. Procurada pela reportagem, a Prefeitura não se pronunciou.

IDAS E VINDAS
O decreto 12.977/18 vem sendo alvo de críticas desde sua publicação no ano passado. Em julho de 2018, o vereador Carlos Jordy (PSL) abriu uma ação contra a regulamentação. A justificativa do parlamentar foi que, por ser baseado em uma lei federal – a lei 13.640/2018 que regulamenta os serviços de transporte por aplicativo no país –, o decreto deveria ser promulgado após a aprovação de uma lei específica do município aprovada pela Câmara.
Em outubro, a desembargadora Maria Regina Nova, do Tribunal de Justiça do Estado do Rio (TJ-RJ), concedeu liminar, decorrente da ação do vereador, derrubando o decreto municipal. Mas, em fevereiro de 2019, a 15ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio restabeleceu o decreto.
As secretarias de Ordem Pública e de Urbanismo e Mobilidade Urbana são as responsáveis pela fiscalização que deveria ter começado no dia 08 de abril mas foi suspensa devido a manifestação do dia 03.
LEGALIDADE DAS REGRAS
A Uber considera o decreto um retrocesso, que infringe o livre direito de escolha de locomoção. Para o advogado e líder da Clínica DDP (Direitos Humanos, Desconstrução e Poder Judiciário), Igor Pereira, o argumento da empresa está incorreto.
- A lei federal 13.640/2018 estabelece aos municípios o poder/dever de regulamentar o transporte privado de passageiros via aplicativo. Essa regulamentação se dá com base numa análise discricionária do próprio município sobre a sua política urbana. Não me parece que esse decreto da Prefeitura, que estabelece esse limite em relação ao emplacamento de veículos, fuja de um padrão de racionalidade que justificaria a intervenção excepcional do Poder Judiciário para limitar o Poder Executivo de traçar a sua própria política urbana. O direito de locomoção dos passageiros fica garantido a partir do momento que o serviço da Uber continua a funcionar, só existe uma restrição no que tange o emplacamento, e o serviço não dá ao passageiro a possibilidade de escolher o veículo. Isso é feito automaticamente – diz.
Duas regras também geram discussões em torno da legalidade da medida - o pagamento, pelas empresas do segmento, do Imposto Sobre Serviço (ISS) e de uma taxa de concessão pela utilização do sistema viário - pois o Poder Executivo precisaria ter acesso ao comprovante de pagamento das viagens que contêm informações sobre o motorista e o trajeto. Esses dados, além de determinarem o percentual do ISS e da taxa por utilização do espaço público a serem pagos, permitirão que a Prefeitura saiba informações pessoais dos usuários, como os endereços pelos quais eles estão se locomovendo.
De acordo com a Uber, as exigências de compartilhamento de informações se opõem às garantias de proteção à privacidade de dados de usuários previstas no Marco Civil da Internet. Para Igor, é necessário que haja um meio termo.
- Repassar as informações estritamente necessárias para que seja feita a determinação do percentual de ISS e da taxa de uso do sistema viário não me parece que viole o Marco Civil da Internet, até porque é uma exigência da própria lei de regulamentação.E para a cobrança de qualquer tributo, é necessário o compartilhamento de informações para que seja, por exemplo, identificado o fato gerador e tudo mais. Porém, não vejo que haja a necessidade da Uber compartilhar as informações pessoais, no que tange os endereços pelos quais os usuários estão se locomovendo, para que haja a cobrança das taxas. O que há necessidade é de se verificar os valores gastos e isso não se refere ao trajeto. Então, passar as informações do trajeto, sem ordem judicial, sem nenhuma justificativa razoável para isso, aí violaria o Marco Civil – afirma.
RIO DE JANEIRO
No Rio, a situação é parecida. Em abril do ano passado, o prefeito Marcelo Crivella publicou um decreto que regulamenta o setor. Entre as normas, está a determinação de uma taxa de 1% em cima de cada corrida. No entanto, em outubro, dez comissões da Câmara de Vereadores deram parecer favorável ao projeto de lei complementar (PLC) nº 78/2018, de autoria do presidente da casa, Jorge Felippe (MDB), e da vereadora Vera Lins (PP), que estabelece regras mais rígidas para os aplicativos de transporte.
O texto da PLC nº 78 prevê que haja um limite para o número de veículos ofertados – na proporção de um carro para cada 750 habitantes -, fim do preço dinâmico e o pagamento de uma taxa, pelos motoristas, de R$148,23 mensais para a Secretaria Municipal de Transportes (SMTR). Além dessas, há ainda duas regras similares à regulamentação de Niterói: os veículos deverão ter no máximo 6 anos de fabricação e, somente, motoristas residentes no município do Rio poderão prestar o serviço.
O projeto precisa ser votado em plenário, porém ainda sem data para ocorrer.
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