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Supervia sob nova direção

  • Foto do escritor: Jornalismo UERJ
    Jornalismo UERJ
  • 6 de mai. de 2019
  • 6 min de leitura

Empresas japonesas aumentaram capital na concessão; especialista destaca pontos importantes a serem resolvidos


Por Paulo Nepomuceno


A SuperVia caminha para estar sob novas mãos: japonesas. Em março a Odebrecht TransPort, detentora de grande parte do capital acionário da empresa, vendeu 84,4% das suas ações para a Guarana Urban Mobility Inc., a Gumi, formada pelas empresas japonesas Mitsui, JR-West e Join. O negócio, segundo fontes do mercado, foi de R$800 milhões. O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) já deu o aval e, para concretização, basta a assinatura do governador Wilson Witzel, do PSC, já que é uma concessão estadual.


A administração tem pela frente resolver problemas que se repetem com frequência: trens com sistema de refrigeração que não dá vazão, vagões superlotados na hora do rush, acidentes, insegurança, estações que são ponto de venda de drogas e diversos problemas infraestruturais.


Só no primeiro trimestre de 2019 foram registradas 121 reclamações na Agetransp, que regula as concessões de meios de transporte no Estado do Rio. O número corresponde a 68% das reclamações realizadas por usuários das barcas, trens e metrô.


Desde 2014, a agência reguladora aplicou 111 penalidades de multa à concessionária, num total de R$ 11,4 milhões em valores atualizados. Apenas 25 destas, que totalizam R$2,7 milhões, foram ou estão sendo quitadas de forma parcelada. As outras 71 penalidades, no valor de R$ 7,4 milhões, já foram inscritas na Dívida Ativa pela agência reguladora. Ainda foram aplicadas outras quinze, no valor de R$1,3 milhão, que ainda estão fase cobrança administrativa ou recurso. A última aplicação ocorreu no dia doze de abril, no valor de R$380 mil, referente a um acidente fatal com uma passageira e a um descumprimento contratual por um incidente com a rede aérea.


Apesar da dívida milionária com multas, a SuperVia melhorou a relação entre quilômetros percorridos e acidentes na malha. Em 2014, a média era de 196,56 km por acidente. Em 2018, o número saltou para 2,748 mil km por acidente, uma diminuição de 1500% nas falhas.


Ainda assim, as insatisfações são onipresentes. A doméstica Ângela Souza, que sai de Magalhães Bastos em direção ao trabalho, em Vila Isabel, diz que enfrenta percalços no trajeto entre a estação do bairro e a Maracanã. Para ela, a maior frequência dos trens resolveria grande parte da superlotação:


– O problema é o intervalo. É muito grande, chega a dez minutos, aí já vem cheio de Santa Cruz e Bangu e não para de encher no caminho. Se tivessem mais trens não teria esse problema.


Para a estudante Julianne Pereira, moradora do Corte Oito, em Duque de Caxias, os trens do ramal Saracuruna são ruins pois a refrigeração não é suficiente para o número de viajantes:


– É um caos. Se tiver muito lotado, o calor é certo. Eles dizem ter ar. Quando está vazio, [como no] final de semana, você até sente, mas dia de semana é certo você sair suando – diz.

A Secretaria de Transportes do Estado (Setrans) recebeu demandas pelo Plano de Diretrizes para serem cumpridas até os cem primeiros dias da atual administração do Executivo do Estado. Além da criação de um grupo de trabalho para revisão da estação Gávea do Metrô, da concessão das Barcas e dos serviços de ônibus intermunicipais, a Secretaria também foi designada para analisar estudos técnicos para o aperfeiçoamento da malha ferroviária do Estado com empréstimo adquirido através do Banco Mundial de US$600 milhões em 2010.


Até o centésimo dia do novo governo, este estudo da Setrans alcançou 75% de andamento.

Em 2018, a SuperVia e a Light fizeram um acordo para encerrar ações que se arrastavam sobre cobranças de contas de fornecimento de energia.


KNOW-HOW DO OUTRO LADO DO MUNDO


Com uma malha ferroviária extensa, o Japão é referência quando o assunto é qualidade no serviço, que conta com trens de alta velocidade e até maglevs, que se movem por levitação magnética. Só a JR-West administra por lá 4,6 mil quilômetros nas ilhas de Kyoshu, Honshu e Shikoku. Nas terras nipônicas obteve, em 2018, faturamento de mais de 111 bilhões de ienes (39 bilhões de reais). O lucro foi de 162 bilhões de ienes, R$5,7 bilhões em valores atuais. Já a Mitsui possui uma empresa de alugueis de locomotivas de última geração na Rússia, Europa e América do Norte.


Por aqui, a Gumi, através da Mitsui, diz não poder revelar valores de futuros aportes, nem confirmou se fará, em breve, alguma movimentação. Em 2014, na união com a Odebrecht TransPort para criar a Odebrecht Mobilidade, o consórcio japonês realizou um investimento de R$550 milhões na SuperVia. O consórcio também destacou que a JR-West já tem contribuído com a melhora na operação da concessão fluminense, mas não especificou em como.

A Odebrecht Transport já sinalizava desde 2017 o interesse da venda das suas participações nos trilhos fluminenses. Em junho daquele ano, o fundo árabe Mubadala tentou comprar ações da empresa, mas os valores foram considerados baixos. O braço do grupo da empreiteira envolvida no escândalo do Petrolão está participando de um processo de reestruturação e avalia se desfazer totalmente dos seus ativos em mobilidade. A empresa também detém participação no VLT do Rio e as construções da Linha 6 do metrô paulista.



ESPECIALISTA CITA PONTOS PRIMORDIAIS NECESSÁRIAS


Para Vitor Mihessen, da Casa Fluminense, uma associação de organizações da sociedade civil que fomenta ações para o desenvolvimento sustentável no Rio, destaca que a sugestão mais votada do eixo de mobilidade urbana na plataforma online Rio por Inteiro, da Casa, foi a de “conferir aos trens metropolitanos a qualidade de serviço do metrô”. Foram 108 candidaturas comprometidas (no executivo e legislativo) e 116 apoios de entidades civis. Em seguida, “estruturar o sistema integrado de transportes” e “licitar o bilhete único e tornar as tarifas transparentes”:


– Em outras palavras, a maioria das organizações sociais da metrópole concordaram que a ação prioritária no setor de transportes de passageiros deveria ser o investimento nos trens metropolitanos, isto é, qualificar a prestação do serviço para alcançar o nível que a lei de concessões estabelece e que é mais facilmente encontrado nos metrôs da cidade do Rio.

Para a segurança, Vitor elenca como essencial medidas de segurança básicas que devem ser adotadas para evitar mortes que, só em 2017, segundo levantamento próprio, foram de 67:


– Para implementar de fato os prometidos “aperfeiçoamentos”, que podem evitar tragédias deste tipo, o consórcio japonês liderado pela empresa Mitsui precisa executar melhorias para estações e ramais, como redução do vão entre o trem e a plataforma, a instalação de sensores nas portas e painéis eletrônicos.


Ele também destaca que o problema da rede vai além da infraestrutura precária, mas também na falta de regulações estatais mais sérias e problemas na integração da cidade:


– No Rio, as tarifas do transporte público comprometem cerca de 20% da renda dos trabalhadores que recebem em torno de um salário mínimo. Pagamos muito caro para um serviço sem qualidade e com pouco controle sobre sua operação e seu financiamento.


Falar de mobilidade urbana a partir daí é ir além dos transportes, da engenharia de tráfego: é pensar em planejamento urbano, gestão, transparência e participação. Pensar na metrópole como um todo, reduzir desigualdades e ampliar as oportunidades de emprego, estudo, lazer e serviços nos diversos territórios, especialmente a partir do fortalecimento das centralidades das periferias.


Meihessen destaca ainda que a expansão da malha sem melhorar a qualidade é uma ótica que não deve ser preferida:


– Para exemplificar, segundo dados das concessionárias, entre 2007 e 2017 foram investidos R$1,2 bilhões de recurso público na qualificação dos ramais da Supervia, onde se deslocam 600 mil passageiros diariamente, oriundos de 12 municípios diferentes. Por outro lado, no mesmo período, foram investidos sete vezes mais no metrô: R$ 8,5 bi na expansão para a Barra, que não chega a transportar 100 mil pessoas/dia. Há de se avaliar em toda política pública, a priorização do uso do orçamento público de forma territorializada, mirando a redução das desigualdades estruturais da metrópole como um todo.


O QUE DIZEM OS CITADOS


A SuperVia diz que 99% das viagens em dias úteis já são climatizadas, número que chega ao total aos fins de semana. Sobre as aplicações de multas, a SuperVia diz que avalia a possibilidade de questioná-las judicialmente nas esferas competentes e que as áreas técnicas da empresa avaliam internamente as determinações de segurança determinadas pela agência reguladora.


Procuradas e questionadas sobre futuros novos investimentos na malha ferroviária, nem a Setrans nem a Secretaria de Estado da Casa Civil e Governança responderam até o fechamento desta reportagem.


A Odebrecht, que também detém participações na SuperVia através da Odebrecht Overseas (ver gráfico) não respondeu se também pretende vender esses ativos na SuperVia.

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