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Mulheres exigem igualdade de gênero no surfe brasileiro

  • pedrowb
  • 3 de jun. de 2019
  • 4 min de leitura

Atletas lutam para serem reconhecidas por seu talento e não apenas pela beleza física



Raquel Heckert é a mais jovem surfista de onda grande do Brasil mesmo sem patrocínio e apoio (Foto: Instagram/Raquel Heckert)

Por Felipe Melo

Em abril de 2019, a WSL (Liga Mundial de Surfe) anunciou a medida EQual Play que seria a equiparação de prêmios entre homens e mulheres em todos os campeonatos e categorias do surfe mundial. Contudo, surfistas profissionais e amadoras através do ‘Comitê para Igualdade do Surfe Feminino’ exigem a transformação do esporte com mais oportunidades de patrocínio, espaço na mídia, valorização do talento das atletas e fim do ideal de beleza física, que predomina nas marcas que propõem investir nas surfistas.


Nos últimos anos, o surfe masculino brasileiro ganhou espaço no cenário mundial com as conquistas de Gabriel Medina e Mineirinho. Com esses títulos, os principais atletas tiveram destaque no mercado e o investimento de grandes empresas em suas carreiras. No entanto, o lado feminino da modalidade ainda carece de apoio e patrocínio e as atletas reclamam do machismo e do domínio masculino na prática do esporte.


Atualmente, o Brasil tem três representantes na elite do surfe mundial: Silvana Lima, vice-campeã mundial em 2008 e 2009, a naturalizada Tatiana Weston-Webb e a jovem Tainá Hinckel. Além delas, outros grandes nomes do esporte despontam com talento e representam o nome do país pelo mundo, como a campeã brasileira de 2018: Camila Cássia, a jovem que se destaca nas ondas grandes, Raquel Heckert, e as atletas Cláudia Gonçalves e Chloé Calmon.


De acordo com a surfista profissional Camila Cássia, apesar da medida do WSL, o espaço e a visibilidade na mídia do surfe masculino sempre foi maior. "O surfe masculino, a meu ver, tem muito mais visibilidade do que o feminino. Todos os campeonatos que já competi, a premiação para a categoria masculina sempre foi muito maior do que a feminina."


Dessa forma, as atletas enfrentam diversas dificuldades para se manter no surfe: falta de incentivo na base, de patrocínio, poucos campeonatos e eventos comparados a modalidade masculina e o machismo que persiste, tanto nas areias, quanto nas campanhas publicitárias e no marketing relacionados ao esporte.


Ainda segundo Cássia, os patrocinadores buscam surfistas de acordo com sua beleza física, como garotas-propaganda para serem modelos de grandes empresas. "É muito difícil conseguir patrocínio aqui no Brasil, as marcas querem um corpo e um rostinho bonito para representá-las, sendo que deveria ser levado empresas conta o surfe da garota em primeiro lugar."


Essa falta de apoio e visibilidade também é destacada pela jovem surfista profissional Raquel Heckert. Além de ouvir cantadas, as atletas convivem diariamente com alguns homens que se acham donos do mar e do esporte. Raquel pratica o esporte desde os 19 anos e ganha destaque, apesar de não ter patrocínio de qualquer empresa. “Sou uma das três surfistas de onda grande do Brasil, não tenho nenhum patrocínio e nunca recebi nenhum apoio do Brasil”, destaca Heckert.


Outro ponto de reclamação das surfistas é o machismo na prática do esporte. De acordo com Heckert, muitos homens não respeitam a entrada de uma mulher na onda e duvidam de sua capacidade de remar e alcançar grandes picos. "Muitos já me perguntaram porque eu faço isso. Para eles, uma menina, delicada, não pode surfar onda grande, já que isso é coisa de homem. Ainda ouço que mulher no tempo deles não fazia isso. Além disso, às vezes não respeitam minha vez no mar, remam na minha onda só porque sou mulher e acham que não vou alcançar ou remar o suficiente" apontou a jovem surfista.


A indumentária ao praticar o esporte também é algo que gera a revolta das atletas profissionais e amadoras. Conforme Catarina Bastos, surfista amadora, muitas mulheres são mal vistas por surfarem de biquíni, sendo julgadas pelo universo masculino da modalidade. Para ela, alguns homens são contra o uso dessa vestimenta por acharem que a atleta quer mostrar o corpo, tirar fotos e ser modelo e não praticar a atividade esportiva de maneira séria. "Acho um absurdo ainda existir esse tipo de julgamento e preconceito dentro do esporte. No verão do Rio de Janeiro, você querer surfar, naquele calor, e ter que usar um Long John por comentários inoportunos de outro surfista na água é ridículo.", destaca Bastos


No entanto, as atletas ressaltam que a internet e os canais de TV por assinatura são importantes para o empoderamento feminino no surfe. Por meio das redes sociais, as atletas encontram outras mulheres que compartilham do mesmo pensamento e podem reivindicar as transformações necessárias para o avanço da modalidade e maior igualdade de gênero no surfe. Já no canal ‘Off’, voltado a cobertura de esportes radicais, de aventura e ligados a natureza, existem programas como ‘Mulheres do Mar’ e ‘México por elas’, que incentivam a luta das mulheres por mudanças no esporte.


"Hoje em dia a internet facilita um pouco as coisas. Podemos ter contato com pessoas que não conhecemos, mas que lutam pelo mesmo ideal, mulheres que querem ser vistas como surfistas e não só pelo seu corpo ou rosto bonito. Então, esse é o momento em que devemos nos unir, para lutar por igualdade e algumas mudanças dentro do nosso esporte.", destaca Cássia.


Diante de todos esses problemas, além da equiparação entre homens e mulheres, a WSL anunciou três outras medidas, por meio de sua CEO Sophie Goldschmidt, buscando transformar e apoiar o surfe feminino no mundo. “Esta é a mais recente de uma série de ações que a Liga se comprometeu trabalhar para nossas atletas do sexo feminino, desde competir na mesma qualidade de ondas que os homens, até melhores locações e mais apoio e divulgação”, comentou Goldschmidt.


Com isso, a liga pretende realizar o lançamento de uma campanha de marketing global para destacar o circuito feminino. Por meio dela, busca aumentar a visualização dos eventos e o envolvimento dos fãs. Além disso, a liga anunciou um programa local para meninas em todo o mundo, com clínicas instrucionais com atletas da WSL em cada etapa feminina do Championship Tour para atrair novas gerações, assim como uma série de conteúdos mensais sobre as mulheres pioneiras do surfe mundial.

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